Estou há tempos para escrever novamente para Plurale.  Desde que voltei de viagem, pego e largo o texto por motivos variados.  Não dá para elencar todos, mas creio que o principal tem a ver com um  conteúdo que faça sentido para mim, para a editora e para vocês. Sei  quantas informações sem sentido recebemos em casa, e também, algumas com  sentido que nem esticamos mais a vinda do sono para ler à noite –  quietos na cama ou na poltrona predileta. O tempo. Tempo para aprender,  para ler com calma para aprimorar relações, para mudar de trabalho, para  trocar de lugar. Atualmente leio três coisas em cada tempo. Uma ficção  boba juvenil para retomar o inglês, um Sandor Marai – húngaro que  escreve um dos bons livros que me foram dados.
Recomendo o título De Verdade,  bem interessante e denso para refletirmos sobre quem somos e para onde  vamos com nossas certezas. E leio também com afinco os textos sobre  sustentabilidade e os fuxicos de internet – enviados por amigas queridas  ou conhecidos que sabem que hoje eu sou senhora de mim, liberta e menos  prisioneira do tempo. E posso pensar em decodificar com calma o que me  proponho a escrever e realizar ainda!
O frio do Rio é ótimo  companheiro para as manhãs e tardes de chá e leitura, arrumações em  casa, coisas e coisas sem fim para dar novo destino: um uso melhor para  quem necessita ou a dolorosa – mas deliciosa – sensação de um local  limpo e harmônico na relação coisa-espaço.
Consigo, com algum  custo, dar coisas quase novas, pois sei que não vou precisar, e chega  este complexo tempo de desapegar. Desapegar-me de filhos que seguem seus  caminhos e sabem que fazem parte de um ambiente de conforto e  consideração incondicional em uma das várias casas onde eles foram  criados, despegar-me de coisa perdida, desapegar-me do delirante vício  do poder, desapegar-me de verdades estabelecidas… Desapegar-me (“de  verdade”, como Marai), ou seja, “desconectar-me” de gente e situações  que não acrescentem. Pode parecer terrível, mas sinto enorme cansaço com  o pacto da mediocridade que sou obrigada a conviver por vez ou outra.
E  quando me sinto assim, morna e medíocre nas minhas posturas,  rapidamente ou nem tanto, uma onda de renovação ou de reposicionamento  surge, no fundo de minhas antigas e novas possibilidades de fazer  acontecer.
Tão difícil desapegar-me de coisas e tão fácil  desapegar-me de pessoas ou desapegar-me do cuidado com a vida. Consegui  com muito custo reverter este desenho. Coisificamos tudo, damos suma  importância à aparência e como os outros nos julgam, e colocamos os  contatos no plano de coisa a menos. E o tal algo mais de Cézanne –  realizado em vida do pintor –, onde as coisas do/no mundo eram vistas  como sentido e cor da natureza e do homem em sua busca de humanidade e  universalidade, somadas com a cortesia. E mesmo o homem da natureza como  o denominava é apenas um elemento vital na ocupação, da vida evidente  ou aparente.
Onde as coisas objetivas para o mundo, observadas e  avaliadas sob a perspectiva humana, tornavam-se sujeitos de si mesmas e a  conversa – entre ele e a coisa e entre ele e natureza das coisas e do  ambiente – passava a ter um sentido de pertencimento no mesmo mundo por  criado e o mundo antes de nossa presença. Aprecio esta maneira de ver as  coisas que nos são gratas e cuidadas como “personna de si mesmas”, dar um pouco de anima  (alma) para estas coisas. Quem sabe se fizéssemos isto com o ambiente  natural e criado não coisificaríamos, e estes dois ambientes integrados  atuariam como sujeitos no mundo.
Isso incluiria quem realmente  colocar no ambiente amizade, qual troca sobre este mesmo mundo você  faria a cada dia, como valorizar as luzes e cores da manhã no bule de  café, as frutas ao acordar e as dobras de uma toalha branca. Viver este  despertar para a luz e para a cor – diferentes a cada momento. Isso era  algo que perseguia Cézanne, e penso muito sobre tudo isto e me sinto  instigada para ver onde estas questões podem me tornar uma personna melhor para o ambiente.
Como  se a cada dia as coisas que eu tivesse à volta despertassem com o homem  racional e sensível ao mesmo momento. O homem com forma, cor e cheiro  totalmente inserido e parte de seu ambiente. Este texto todo para dizer  que gosto em Cézanne e outros artistas ligados ao pertencimento ao  ambiente. Este pertencer tão complexo quando falamos do sujeito e do  ambiente que ele precisa aprender a conviver. A memória das coisas e dos  momentos constrói as relações aonde vou tecendo o pano de retalhos da  mesa matinal e da vida: a cortesia e a permanência do contato. No  processo de coisificação que estamos passando, cada sujeito dá o valor e  a intensidade de contato, conforme a utilidade e, assim, caminha nesta  “coisa-humanidade e na humanidade-coisa”.
Acumulamos muito, e nem  sempre antes de comprar algo novo, limpamos as gavetas. Creio que é  assim com o pensamento e reflexões em casa sozinha sobre o que realmente  é possível realizar neste espaço de acúmulos e de baixas avaliações  sobre como refletimos para mudança de atitudes.
Espero que você  possa – de quando em vez ou com qualidade – parar e ler com cuidado e  delicadeza o que lhe interesse. E caso este texto traga um pequeno algo  mais: o olhar dos opostos e da intensidade na profusão de diversidade  que o cerca. Que você possa enviar o seu algo mais para o outro. Como a  curva de Moebius(1), onde tanto se deve olhar e viver na parte interna  como na parte externa da fita – ver uma mesma questão por todos os seus  lados de possibilidades e assim descobrirmos, que a cada leitura, a cada  troca de impressões, a cada retorno (estamos sempre no eterno retorno e  nunca será idêntico) a realização do outro. Podemos ser o algo mais  aprimorado e não coisificado.
Podemos duvidar possuir ou  manifestar opiniões divergentes em relação a qualquer um, mas sabemos  que existe um direito inalienável de ver a coisa ou o sujeito por meio  de outra referência – outro ponto do observador. Desta forma, eu, aqui,  também esclareço que não tenho nada contra qualquer pessoa que decida ou  deixe a vida externa decidir por ela. Que encontra significado ter um  processo de crescimento no mundo sem tantas considerações. Este estado,  para mim, não funciona, pois sou absolutamente comprometida e  responsável com as minhas escolhas de fazer ou de inércia.
Atualmente,  tenho visto muitas pessoas que privilegiam a vida pela superfície das  questões… É obvio que não se pode passar o dia em profundas elucubrações  sobre tudo. Seria exaustivo. Eu ainda fecho com alguns queridos sábios,  que se você for tomar um simples banho, que seja real na sua escolha e  simples na forma, para que durante o pequeno tempo que você deveria  ficar lá na economia de água e sabão, você possa refletir sobre si sobre  o famoso Dasein (ser aí neste mundo e fruto de todos os mundos passados  vivenciados).
Você pensa sobre o valor do sujeito e o valor da  coisa que artificialmente valoriza ou você qualifica o sujeito. Na fase  inicial da vida em que estamos ligados ao lugar confortável do materno é  aí que as “formas de afetos” começam a ser processadas em nosso local  do sensível no cérebro, e estas conexões perduram por toda vida quando  iniciadas e estimuladas.
Pode ser por falta deste laço e por não  termos mais as relações de afeto atualizadas a todo dia que perdemos a  capacidade de ponderar entre o afeto e o racional, entre o desejo e o  interesse, entre necessidade compartilhada e egoísta. É nesta escada do  desenvolvimento que teremos habilidade para lidar com o que discordamos  no mundo externo ao mundo materno e chegaremos por meio do processo  educacional, da disciplina e do limite ao mundo da cortesia. A cortesia  está para mim no último degrau; trocamos a emoção com nossas mães de  forma egoísta para sobrevivência, elas e os pais ensinam ou deveriam  ensinar formas de sermos gentis em família, de conceder e com a escola  formal e as relações de amizade e trabalho do mundo em volta,  desenvolvemos a cortesia. E você neste momento para de ler e reflete: o  que isto tem a ver com a sustentabilidade do título?
Pode ser que  se não conseguimos fazer a conexão é exatamente neste ponto que perdemos  ou não apreendemos a cortesia. Pois a cortesia é ensinada sutilmente no  dia a dia em casa e depois na escola. Pode ser também que nesta fase  estejamos construindo um ser que não terá habilidade para relativizar,  para mudar quando escuta com atenção e dedicação algo que o outro lhe  traz. Isto pode ser boa oportunidade para si, para os dois e para a  sociedade do entorno. Nesta fase, muito pequenos e inconscientes da  realidade e do ambiente que nos vai moldar, traçamos o famoso caminho  individual dentro do processo civilizatório das conexões humanas. Ah! E  isto sim tem tudo a ver com sustentabilidade das relações, do ambiente  natural ou criado por mim e pelo outro.
Acredito que o processo de  envolvimento dos indivíduos com o ambiente – crianças, adolescentes e  adultos – tem a mesma correspondência com o grau de desenvolvimento da  cortesia que você dedica a si mesmo (cuidado com sua mente e com seu  corpo) e a cortesia que trocamos entre pessoas tão diferentes e por  vezes aquelas que não concordamos com o modo de ver e se perceber no  mundo.
Por fim, percebo que como não desenvolvemos bem a cortesia em um local que:
• O coletivo vale pouco;
• A sociedade brasileira é ainda deficitária em alguns processos de trocas;
• A integridade e o caráter têm várias possibilidades;
• A pessoa é assertiva na apropriação de um bem público como uma coisa privada;
• A coisificação do sujeito para a vida se deu em função da ausência dos afetos e cuidados familiares;
• A escola, o aprendizado e o conhecimento não fazem parte da construção do sujeito moral do Dasein – o ser aí no mundo dedicado a construir e manter o seu local melhor para si e para quem vier.
• O coletivo vale pouco;
• A sociedade brasileira é ainda deficitária em alguns processos de trocas;
• A integridade e o caráter têm várias possibilidades;
• A pessoa é assertiva na apropriação de um bem público como uma coisa privada;
• A coisificação do sujeito para a vida se deu em função da ausência dos afetos e cuidados familiares;
• A escola, o aprendizado e o conhecimento não fazem parte da construção do sujeito moral do Dasein – o ser aí no mundo dedicado a construir e manter o seu local melhor para si e para quem vier.
O  que isto tem a ver com sustentabilidade? Tem bastante por mais que você  no momento não consiga ou não possa fazer as conexões assim como Cézanne  – ele passava boa parte do seu tempo realmente pensando em como mudar  de atitude em tela e partia para uma viagem de riscos nesta mudança de  atitude. Qualquer mudança vai exigir algum tempo de engajamento prévio,  para que se possa mudar efetivamente e encarar a sustentabilidade  fragmentada ou em nosso cotidiano.
Normalmente somos confortados ou atuamos no que chamo de uma sustentabilidade fashion:  a do espetáculo, colocada em local confortável da fala e do não  comprometimento pela ação: rechaçada a conversas informais e  descontraídas do chopp de sexta-feira, após o trabalho exaustivo e, por  vezes, repetitivo. A tal da sustentabilidade possível em vida – vai  acontecer no seu ou no meu cotidiano, se primeiro verificarmos nossa  conexão com a cortesia para o outro e para outros espaços que não  somente o conhecido e/ou aqueles que temos interesse em sempre ganhar  algo. Se verificarmos também se esta nossa cortesia nos pode levar a uma  postura de aceitação da diferença – a diversidade de jeitos e culturas.  Algo que não é necessariamente no primeiro momento aquele chamado do  algo mais de Cézanne – que faz de você um ser melhor quando pensa em  quanto arriscou para uma mudança.
Porém, já um algo que mexe com  você para a cortesia sempre presente em suas ações e nas relações com as  pessoas. (O que deveria ser normal e não evidenciada no espaço que você  troca, habita, trabalha e impacta). Porque não impactar pela cortesia e  pela possível e concreta atitude na e para sustentabilidade que você  possa incorporar de forma permanente?
No próximo texto vou abordar  mais a sustentabilidade dos contatos duradouros e/ou de fidelidade –  que estão intimamente conectados com a agenda pessoal da  sustentabilidade possível. Tempo e confiança são as palavras-chave!
Nota
(1) Curva de Moebius – esta curva nasceu da matemática e foi levada para o mundo da psyqué, onde a vida, na verdade, tem um lado o de fora mescla com o de dentro. E não existe o lado do bem para uns e lado do mal. Possuímos e agimos sempre esta polaridade que nos faz ver a vida de maneira diversa: o olhar por dentro de si e olhar por fora de si – para analisar com mais isenção, e que de certa forma estamos fadados a circular neste eterno retorno, mas nunca de mesma forma, pois a cada volta (do dia, das passagens, dos ritos, etc.) existe a influência do outro e do meio.
(1) Curva de Moebius – esta curva nasceu da matemática e foi levada para o mundo da psyqué, onde a vida, na verdade, tem um lado o de fora mescla com o de dentro. E não existe o lado do bem para uns e lado do mal. Possuímos e agimos sempre esta polaridade que nos faz ver a vida de maneira diversa: o olhar por dentro de si e olhar por fora de si – para analisar com mais isenção, e que de certa forma estamos fadados a circular neste eterno retorno, mas nunca de mesma forma, pois a cada volta (do dia, das passagens, dos ritos, etc.) existe a influência do outro e do meio.
* Vania Velloso é arquiteta, com especialização em Filosofia e Gestão Ambiental, artista e cozinheira.
** Publicado originalmente no site da revista Plurale.

 
 









 O  telescópio espacial Kepler encontrou um planeta com dois sóis. A  descoberta, feita pela agência espacial americana Nasa, foi divulgada em  um estudo publicado nesta quinta-feira, onde cientistas mostram como é o  astro, de tamanho próximo ao de Saturno.
O  telescópio espacial Kepler encontrou um planeta com dois sóis. A  descoberta, feita pela agência espacial americana Nasa, foi divulgada em  um estudo publicado nesta quinta-feira, onde cientistas mostram como é o  astro, de tamanho próximo ao de Saturno.









 O golfinho-rotador é a terceira espécie de golfinho mais abundante do mundo;
 O golfinho-rotador é a terceira espécie de golfinho mais abundante do mundo;


